TOP 10 LENDAS MOTOGP: 10º Barry Sheene
A LENDA DO 7, por Ricardo S. Araújo
Fazer um Top 10 dos melhores pilotos de todos os tempos é um exercício altamente subjectivo... e altamente interessante. Então quando se trata do Mundial de Motociclismo, o mais antigo campeonato do mundo do desporto motorizado (1949), a tarefa atinge contornos de odisseia. Não é fácil comparar diferentes épocas, diferentes estilos, diferentes tecnologias, além de uma generosa lista de talentos com mais de seis décadas.
O primeiro passo é estabelecer um critério que confira credibilidade à tentativa. Neste caso, optámos por analisar o papel que a moto e a tecnologia inerente desempenharam no sucesso de cada piloto. Por exemplo: entre 1952 e 1974, a única forma de ganhar títulos na classe-rainha era pilotar uma Gilera ou uma MV Agusta oficial. Pilotos brilhantes como Phil Read ou John Surtees ficaram fora desta lista devido à incrível supremacia das motos do conde Agusta. A oposição em cada época também foi tida em conta. A concorrência que Geoff Duke enfrentou nos primórdios do campeonato não foi a mesma que Eddie Lawson teve em 1989, quando correu contra Wayne Rainey, Kevin Schwantz, Michael Doohan e Wayne Gardner...
TOP 10 LENDAS MOTOGP: 10º Barry Sheene -
"Sheene the Machine"
A dura escolha do décimo lugar recaiu numa das primeiras 'superstars' do Mundial: Barry Sheene. O inglês de cabelos longos atingiu uma popularidade inigualável nos anos 70 devido à sua personalidade carismática e atitude determinada. Sheene era uma espécie de Beatle do motociclismo. Filho de um engenheiro do "Royal College of Surgeons", teve uma juventude desafogada onde cultivaria um espírito de rebelde e 'playboy'. Depois de se sagrar campeão britânico de 125cc, estreou-se no Mundial aos 20 anos e foi segundo no primeiro GP que disputou. Ao longo da sua carreira, venceu corridas de 50cc, 125cc, 500cc e da Fórmula FIM 750cc, uma taça criada em 1973 e que Sheene venceu com a Suzuki no ano de estreia. A longa ligação à marca japonesa deu-lhe os dois títulos mundiais de 500cc, em 1976 e 77, numa altura em que o número 7 já arrastava uma imensa legião de fãs.
TOP 10 LENDAS MOTOGP: 10º Barry Sheene -
Para o seu estatuto também contribuiu a rivalidade com Kenny Roberts, com quem travou batalhas memoráveis como no GP da Grã-Bretanha de 1979. Mas, além de adversários em pista, Sheene e Roberts também eram ferozes contestatários das condições de segurança dos circuitos da altura, entre os quais o da Ilha de Man. Menos conhecido foi o facto de Sheene ter inventado um dos primeiros protectores de costas para pilotos, um modelo feito com visores de capacetes e cujos direitos o inglês cedeu depois à Dainese. Retirado na Austrália onde foi comentador das provas do Mundial, Barry Sheene morreu devido a um cancro no estômago e no esófago em 2003. O final humano de uma lenda intemporal.
TOP 10 LENDAS MOTOGP: 9º Freddie Spencer
CHAMAVAM-LHE 'FAST FREDDIE', por Ricardo S. Araújo
"Spencer era como um daqueles relógios caros feitos à mão: perfeito mas frágil". Foi esta a resposta do jornalista inglês David Emmett quando lhe pedimos para descrever Freddie Spencer, o maior prodígio que atingiu o Mundial de Motociclismo na década de 1980.
O norte-americano foi, ao mesmo tempo, um fenómeno e um mistério. O mesmo piloto que venceu a primeira corrida na classe-raínha aos 20 anos e que aos 21 se tornou o mais jovem Campeão do Mundo de sempre, venceu o último GP quando tinha 23 anos... Porquê? A resposta (ou a falta dela) é o que torna a história tão singular.
Rumo ao estrelato
Freddie Spencer era um talento extraordinariamente precoce que fez a formação nas dirt-tracks americanas. Quando mudou para as pistas de asfalto, venceu o campeonato AMA de 250cc à frente de outra lenda com lugar nesta série, Eddie Lawson. Aos 18 anos, chocou o Mundo ao bater os campeões de 500cc Barry Sheene e Kenny Roberts no Desafio Transatlântico, uma interessante competição que todos os anos opunha os melhores pilotos americanos e britânicos.
Não demorou muito até que a Honda recrutasse o prodígio de Shreveport. A marca japonesa colocou-o primeiro nas Superbikes americanas e mais tarde no Mundial de 500cc (na foto), onde venceu a primeira corrida em 1982, com apenas 20 anos. É aqui que nasce a relação entre Spencer e o lendário preparador Erv Kanemoto, com quem Spencer conquistaria os seus três títulos mundiais. O primeiro surgiu em 1983, após uma batalha épica com o tricampeão da Yamaha, Kenny Roberts. A glória suprema aos 21 anos - algo que o mais importante campeonato do motociclismo nunca mais viu.
O princípio do fim
Lesões e um projecto radical (e pouco fiável) da Honda, a NSR-500 V4, minaram a defesa do título em 1984. No ano seguinte, Spencer conseguiu um dos maiores feitos da História do motociclismo. Numa incrível sucessão de corridas e vitórias, o americano começou por ganhar a mais importante prova do seu país, as Daytona 200 em três classes diferentes (!). Seguiu-se o inédito duplo título mundial de 500cc e 250cc... algo que trouxe a Spencer um estatuto de lenda mas também problemas físicos resultantes de centenas de corridas, sessões de treinos e testes. Nunca mais ganhou outro GP.
Muitos disseram que Spencer nunca lidou bem com a pressão resultante de um sucesso meteórico; outros deram uma explicação bem mais científica: Spencer sofria do Síndroma do Túnel Cárpico, uma doença que vários pilotos desenvolvem devido ao esforço exigido nos punhos e antebraços.
TOP 10 LENDAS MOTOGP: 8º KEVIN SCHWANTZ
O ARTISTA DO TEXAS, por Ricardo S. Araújo
O estilo "tudo ou nada" fez de Kevin Schwantz um dos pilotos mais populares da História do motociclismo. Pena que tanto talento tenha rendido apenas um título.
Se hoje em dia for à secção de capacetes da Sport Zone é provável que encontre uma prateleira repleta de exemplares fluorescentes de Valentino Rossi. Não há capacetes de Lorenzo nem de Pedrosa nem de Stoner. O italiano é o único verdadeiro ícone do motociclismo. Pois bem: há 15 anos atrás esse estatuto pertencia a Kevin Schwantz. O capacete do mítico número 34 foi replicado na estrada por milhares de utilizadores das duas rodas. Schwantz representava uma filosofia de ataque sem compromissos, uma constante procura do limite que foi o traço distintivo dos maiores ídolos do desporto motorizado, de Gilles Villeneuve a Colin McRae.
Para Schwantz, o conceito de 'gestão de corrida' não existia. Quanto muito, podia 'preparar' um adversário ao longo de uma corrida, passando-o numa curva e abrindo a trajectória na seguinte... até que na altura decisiva, normalmente na última volta, uma ultrapassagem sobrenatural colocava a Suzuki em definitivo na frente. E isso era ainda mais notável quando os adversários se chamavam Wayne Rainey, Michael Doohan, Wayne Gardner ou Eddie Lawson... A incrível propensão para ultrapassagens 'impossiveis' - baseada numa sensibilidade invulgar para travar 50 metros mais tarde e segurar o inevitável ricochete da Física - era o truque mais famoso do artista Schwantz.
Suzuki condicionou carreira
A história do texano começou como a de tantos outros pilotos: os pais tinha uma loja de motos e o jovem Kevin cresceu rodeado de motores, pneus e corridas. O primeiro ídolo de infância foi a estrela britânica do trial Mick Andrews, que visitava a loja dos Schwantz e mostrava a modalidade ao pequeno Kevin, enquanto este lhe dava umas lições de bilhar. Na adolescência, Schwantz virou-se para o motocross mas viria a abandonar devido a algo recorrente na sua carreira: quedas e lesões.
A histórica ligação à Suzuki começou em 1984, com apenas 20 anos. O piloto e jornalista John Ulrich arranjou-lhe um teste com a equipa Yoshimura Suzuki de Superbikes, e antes colocou-o a fazer voltas o dia todo com uma . Na manhã seguinte, a Yoshimura trouxe a Superbike e horas mais tarde Schwantz já estava a rodar próximo do recorde da pista. Os japoneses queriam assinar logo ali mas o jovem piloto estava mais preocupado em saber como contar a novidade à mãe, uma eterna céptica das corridas...
O resto é história: até se retirar, Schwantz nunca mais correu por outra marca. E talvez isso tenha prejudicado o legado do americano, que durante anos lutou com uma Suzuki RGV500 inferior às Yamaha e Honda da concorrência. As vitórias foram-se sucedendo mas os títulos ficavam para Lawson, Gardner e para o eterno rival, Wayne Rayney, com quem discutiu corridas desde os tempos das Superbikes americanas, em 1987. Quando Rainey ficou paralisado em 1993 e lhe abriu as portas do título, Schwantz começou a encarar o desporto de outra forma. Abdicou em 1995, aos 31 anos, com uma longa lista de lesões e uma legião de adeptos por todo o mundo. São assim os heróis.
TOP 10 LENDAS MOTOGP: 7º Wayne Rainey
Até onde teria chegado Wayne Rainey sem aquela queda no GP de Itália em 1993? Três títulos mundiais não chegam para contar toda a história deste americano brilhante.
O SENHOR PERFEITO, por Ricardo S. Araújo
Os 'ses' são uma das partes mais difíceis ao elaborar um ranking dos gigantes da História. E se... Freddie Spencer não se tivesse eclipsado após a incrível época de 1985? E se... Kevin Schwantz tivesse tido um mentor como Kenny Roberts no início de carreira? E se... Wayne Rainey nunca tivesse ficado paraplégico naquela tarde de Misano em 1993?... Esta é, provavelmente, a maior incógnita da década de 90 do Mundial de Motociclismo. Rainey e a Yamaha estavam a caminho do quarto título consecutivo e em termos históricos poderiam perfeitamente ter alcançado o domínio que Michael Doohan e a Honda exerceram anos mais tarde. Só que um exercício tão subjectivo como eleger os melhores de sempre tem de procurar bases sólidas para ganhar credibilidade... e os 'ses' fazem tudo menos isso. É por isso que Doohan surge à frente de Rainey e Schwantz nesta lista, mesmo se o australiano nunca ganhou um título (foram cinco) perante um adversário do calibre dos dois americanos.
TOP 10 LENDAS MOTOGP: 7º Wayne Rainey -
Classe à parte
Rainey dominou o Mundial no apogeu das brutais 500cc a dois tempos. Máquinas infernais de pouco mais de 100kg e 180 cavalos, com uma pequena faixa de potência mas de uma entrega instantânea e letal: os limites só estavam ao alcance de predestinados.
Talvez por isso, não era normal naquela época ver pilotos de 20 ou 21 anos na classe-rainha como é actualmente. Rainey tinha 27 anos quando se estreou no Mundial de 500cc pela mão de 'King' Kenny Roberts. Para trás ficava a escola incontornável das dirt-tracks, uma experiência prematura nas 250cc e dois títulos americanos de Superbikes. O primeiro em 1987, contra um jovem texano quatro anos mais novo chamado Kevin Schwantz. Os épicos duelos Rainey-Schwantz começaram nesse ano no Desafio Transatlântico, em Inglaterra. Durante as seis épocas seguintes, Rainey e Schwantz foram como Prost e Senna: duas filosofias dominantes e de estilos opostos, o brilhantismo metódico contra o talento exuberante - mas que precisavam um do outro para chegarem ao limite.
Rainey ganhou três títulos consecutivos e liderava o campeonato quando uma queda incaracterística o deixou confinado a uma cadeira de rodas. Procurou os conselhos de Frank Williams e regressou ao Mundial como Team Manager da sua marca de sempre, a Yamaha. Mas para os adeptos ficará a recordação do estilo limpo, de trajectórias quase perfeitas e uma consistência invulgar. Três títulos não contam a história toda sobre Wayne Rainey.
TOP 10 LENDAS MOTOGP: 6º MICK DOOHAN
MÁQUINA DE VENCER, por Ricardo S. Araújo
Michael Doohan ganhou um lugar na História com cinco títulos mundiais e uma determinação lendária. O australiano sobreviveu a quase tudo.
O motociclismo é um dos desportos mais perigosos do mundo. No capítulo da dor física, a lista de campeões do Mundo está cheia de indivíduos que sofreram para lá do imaginável. Sheene e Schwantz, por exemplo, alcançaram a glória depois de um caminho tortuoso, cheio de ossos partidos e articulações lesionadas. Mas este é um desporto cheio de homens especiais... e Mick Doohan é decididamente um deles.
Se algum dia passar pelo australiano irá concerteza reparar nas suas mazelas físicas. A perna direita permanentemente desfigurada e o dedo mínimo da mão esquerda parcialmente ammotado são 'recordações' de uma carreira passada a 'brincar' com os limites. Mas 'limite' era uma palavra constantemente redefinida por Doohan.
Em 1992, uma queda nos treinos do GP da Holanda resultou em várias fracturas na perna direita, numa altura em que Doohan caminhava para o seu primeiro título mundial. Complicações graves levaram os médicos de Assen a ponderar a ammotação, algo que só foi evitado graças à intervenção do famoso Dr. Costa, que levou o piloto para Itália. Doohan tinha então uma vantagem de 53 pontos sobre Wayne Rainey - oito semanas depois, um heróico e prematuro regresso tentou salvar o campeonato mas, debilitado, perdeu o título por quatro pontos. Domingos Piedade, amigo pessoal do australiano há quase 20 anos, conta uma história curiosa sobre esse momento: "Todos no paddock, pilotos incluídos, estavam chocados ao verem o Mick subir e descer da moto com a ajuda dos mecânicos. Como era possível estar a pilotar dois meses depois de quase ter ficado sem a perna? O sentimento era tão forte que se gerou um movimento dos pilotos Honda para o deixarem passar caso ele precisasse dos pontos. Quando o Mick soube disso, jurou que se atirava para o chão se isso acontecesse"...
Entre tubarões
Doohan cresceu na Costa Dourada, no mesmo estado que anos mais tarde viu nascer o seu sucessor, Casey Stoner. Apesar da histórica ligação à Honda, começaria nas Superbikes australianas com a Yamaha. Aos 23 anos, deu nas vistas ao vencer três das quatro corridas que disputou no primeiro Mundial de Superbikes, em 1988. Duas dessas vitórias foram na pista australiana de Oran Park, por mais de 20 segundos. Não admirou que no final do ano tivesse ofertas da Yamaha, Honda e Suzuki para correr no Mundial de 500cc. Doohan escolheu a Honda e nunca mais pilotou para outra marca. Na equipa Rothmans encontrou dois campeões do Mundo, o compatriota Wayne Gardner e Eddie Lawson. Foi a era das brutais 500cc a dois tempos com o Mundial pejado de talento: Lawson, Rainey, Gardner, Schwantz, Mamola, etc.
Apesar do título perdido em 1992, Doohan foi refinando a NSR500 e acabou por torná-la na máquina da década. A sua capacidade para afinar a suspensão e a geometria da moto contribuíram tanto para os seus cinco títulos mundiais como o seu talento e determinação. Ficou igualmente famosa a célebre adaptação do controlo do travão traseiro na manete esquerda, consequência da perda de mobilidade na perna direita.
O fim, definitivo, chegou em 1999 quando voltou a fracturar a perna, o ombro e um pulso. Foram-lhe colocados doze parafusos na perna e Doohan teve de abdicar. Mas o seu carácter é bem resumido por Domingos Piedade: "Uma vez ele ficou em minha casa de férias e os meus filhos viram-no em calções junto à piscina. Eles ficaram muito admirados e perguntaram, 'Mick, o que aconteceu às tuas pernas?!! Ele fez aquele sorriso típico e respondeu, Foi uma luta com tubarões!"...
TOP 10 LENDAS MOTOGP: 5º Kenny Roberts
por Ricardo S. Araújo
Não é por acaso que chamam a Kenny Roberts o 'Rei'. A vida do primeiro campeão mundial vindo dos States foi uma incrível sucessão de êxitos.
Actualmente com 58 anos, Kenneth Leroy Roberts conviveu a vida toda com a palavra 'sucesso'. Os numerosos títulos nas dirt tracks e pistas de asfalto americanas, os três campeonatos mundiais de 500cc, o sucesso obtido enquanto Team Manager da Yamaha, até o inédito título mundial do herdeiro Kenny Jr. (o único caso de um pai e filho campeões do mundo) são testamentos para a posteridade de uma das maiores figuras do motociclismo. Menos conhecidas são outras facetas de 'King' Kenny: a sua demanda pela segurança nos circuitos nos anos 70, que o levou mesmo a ameaçar a FIM com a criação de um campeonato paralelo chamado World Series; o facto de ter sido o precursor de um estilo de pilotagem que influenciou gerações de pilotos depois de si; o facto de ter sido mentor de outros campeões como Eddie Lawson, Wayne Rainey e John Kocinski, este nas 250cc; a corajosa tentativa de atacar o Mundial de 500cc com uma moto própria - financiada pelo governo malaio -, algo que contrastava com o domínio histórico dos gigantes japoneses.
O legado de Roberts só poderá ter sido prejudicado pelo nível da oposição naqueles três títulos mundiais, entre 1978 e 1980. Ficaram célebres os seus duelos com Barry Sheene mas pilotos como Wil Hartog, Johnny Cecotto ou Virginio Ferrari não tinham o mesmo talento da geração que inundou o Mundial na década seguinte. Em 1983, Roberts saiu de cena após perder um quarto título mundial para um fenómeno chamado Freddie Spencer. O frágil e delicado Spencer estava no extremo oposto do rude e determinado Roberts, que se referia ao seu jovem rival como "aquele menino de coro". Mas seria o menino-bonito da Honda a levar a melhor na penúltima prova do ano, na Suécia, quando levou Roberts a sair de pista na última curva da corrida. O veterano ainda venceu o último GP da época em Imola, que se transformou numa despedida adequada para uma carreira notável.
O 'throttle steering'
Antes de atravessar o Atlântico, o jovem Roberts tornou-se uma lenda das competições nacionais da AMA. Nas dirt tracks, a Yamaha pilotada por ele era a única capaz de derrotar a todo-poderosa Harley Davidson, como aconteceu naquela lendária corrida de Indianápolis em 1975. Ainda assim, poucos esperavam que Roberts vencesse o Campeonato do Mundo de 500cc à primeira tentativa em 1978. Foi o primeiro título de um norte-americano na mais importante competição do motociclismo. Além disso, o californiano introduziu uma técnica claramente inspirada nas pistas de terra chamada 'throttle steering'. No fundo, trata-se de aproveitar toda a potência e rotação do motor para sair de uma curva em derrapagem controlada, com a moto a 'apontar' para a trajectória desejada. Roberts também é considerado um dos primeiros pilotos a ter usado a inclinação do joelho para melhor descrever as curvas apertadas. Além de tricampeão mundial e uma figura incontornável, o 'Rei' foi um pioneiro do motociclismo moderno.
KING KENNY GP: 60 Pódios: 44 Vitórias: 24 (500cc, 22; 250cc, 2) Títulos mundiais: 3 (500cc, 1978-80) Primeiro GP: Holanda, 1974 (250cc) Primeira vitória: Venezuela, 1978 (250cc) Última vitória: San Marino, 1983 (500cc) 7 vitórias Fórmula FIM 750cc Bicampeão AMA Grand National (1973-74)
TOP 10 LENDAS DO MOTOGP: 4º Mike Hailwood
Nenhum piloto terá despertado o imaginário dos amantes do motociclismo da sua época como Mike Hailwood. O britânico tornou-se um mito dentro e fora das pistas.
O LENDÁRIO 'THE BIKE', por Ricardo S. Araújo
O quarto lugar deste ranking foi uma das escolhas mais difíceis que tivemos de fazer. Com vários 'monstros' já escalonados anteriormente, surgiram dois nomes para o lugar: Eddie Lawson e Mike Hailwood. A escolha teve que ser feita recorrendo aos critérios definidos inicialmente: o papel da moto no desempenho individual, o nível da oposição em cada época e, em última análise, o sucesso atingido por cada um.
Este último factor dava uma clara vantagem a Hailwood, que foi nove vezes campeão do Mundo (contra quatro de Lawson), venceu 76 Grandes Prémios (31 de Lawson) e ganhou 14 vezes o famoso Tourist Trophy da Ilha de Man. Só que entre 1958 e 1974 (umas incríveis 17 épocas), a única forma de ser campeão na classe-rainha era pilotar uma das MV Agusta oficiais. A supremacia das motos do conde Agusta tornava os seus pilotos em instantâneos favoritos ao título. Hailwood venceu as 500cc por quatro vezes, sempre com as motos italianas. Não que isto retire brilhantismo à performance, mas Lawson foi o primeiro piloto da História a ser campeão com duas motos diferentes em anos consecutivos (algo que só Valentino Rossi igualou, em 2004). Além disso, ao longo de toda a sua carreira, os únicos rivais de peso de Hailwood foram Giacomo Agostini e Phil Read; Lawson, por outro lado, garantiu o quarto título em 1989 numa grelha onde estavam Wayne Rainey, Kevin Schwantz, Mick Doohan, Wayne Gardner, Randy Mamola, Ron Haslam... Estes critérios deram uma vantagem - pequena, é certo - a Eddie Lawson. Mas Mike 'The Bike' terá sempre lugar no panteão dos Grandes.
Talento natural
Quem era afinal Stanley Michael Hailwood? Para quem o viu correr - de pilotos a engenheiros, de preparadores a jornalistas -, Hailwood foi um dos maiores talentos naturais que o motociclismo já conheceu. Um jovem irreverente vindo de uma família rica - o pai fez fortuna a vender motos na Grã-Bretanha - que deixou a escola aos 16 anos para ir trabalhar para a Triumph como simples aprendiz. Alguém que aprendeu a pilotar num terreno de 30 mil metros quadrados onde desgastou uma oval das constantes voltas que dava aos domingos a seguir à missa. Um fenómeno que teve sempre as melhores motos que o dinheiro podia comprar... mas que as levava ao limite com o à-vontade dos predestinados.
Hailwood venceu o primeiro Mundial em 1961 (aos 21 anos), com uma pequena firma japonesa chamada Honda. Foi aí que Soichiro Honda ganhou estima por aquele jovem britânico que lhe deu o título de 250cc com a bela Honda RC161 de quatro cilindros. Anos depois, o fundador da Honda perdoou a rebeldia de Hailwood quando este, furioso com o desempenho dos amortecedores da sua moto, atirou-os para dentro de um lago em Suzuka, onde a equipa estava a testar. Antes disso, Hailwood já tinha sido primeiro piloto a vencer quatro títulos consecutivos de 500cc, na equipa do irascível conde Domenico Agusta, com quem Hailwood se desentendeu por achar que a equipa favorecia Agostini.Mas o verdadeiro testamento do talento de Hailwood deu-se quando ele voltou de um retiro de 11 anos (!) para vencer o TT da Ilha de Man. Na altura, Hailwood tinha-se retirado para a Nova Zelândia, como tantos outros ingleses, para fugir aos impostos. Em 1978, com 38 anos, Hailwood regressou ao perigoso circuito de Man para vencer com uma Ducati 900SS. No ano seguinte, com uma Suzuki RG500 a dois tempos, ele provou que podia adaptar-se à nova realidade vencendo em Man pela última vez. Imagine-se como foi voltar a pilotar uma moto de GP após uma evolução de 12 anos nos motores, quadros, pneus, equipamento, níveis de aderência, distâncias de travagem, etc. Hailwood morreu dois anos depois num trágico acidente de automóvel, mas a sua vida é umas das histórias mais fascinantes do desporto motorizado.
TOP 10 LENDAS DO MOTOGP: 2º Giacomo Agostini
"Há quem tenha nascido artista e há quem tenha nascido poeta; eu nasci para pilotar motos." Giacomo Agostini, 1967
O look de estrela de Hollywood escondia um dos maiores talentos natos da história do motociclismo. O génio de Giacomo Agostini ainda hoje é venerado pelos seus congéneres.
Por: Ricardo S. Araújo
Entre 1968 e 1971 dismotaram-se 69 Grandes Prémios do Mundial de Motociclismo nas duas classes principais, 500cc e 350cc. Essas 69 corridas consecutivas tiveram apenas um vencedor: Giacomo Agostini. O que acabou de ler é, porventura, um dos recordes mais impressionantes da história do Mundial, mesmo se é preciso contextualizá-lo com a esmagadora supremacia da equipa oficial da MV Agusta, e com o facto de Agostini ter ficado sem o seu maior rival no final de 1967: Mike Hailwood. Aliás, há quem defenda que 'Ago' não teria conquistado uns incríveis 15 títulos mundiais se Mike 'The Bike' não se tivesse retirado tão cedo e se o promissor finlandês Jarno Saarinen não tivesse morrido em Monza, em 1973. Porém, a capacidade de Agostini para acumular sucesso adveio do seu extraordinário talento natural. A frase que começou este texto foi proferida no histórico vídeo que apresentamos em baixo, uma das poucas oportunidades de ver e ouvir Agostini em acção.
Manobras do destino
Tal como Mike Hailwood, Agostini nasceu no seio de uma família abastada - dinheiro nunca foi problema. O problema foi convencer o pai, rico industrial de Bergamo, a deixá-lo seguir um desporto tão perigoso. Conta-se que Agostini convenceu um notário amigo da família a passar-lhe um documento que o autorizava a participar em provas de ciclismo... escondendo deliberadamente o prefixo 'moto'. Assim que legalmente habilitado, o jovem Agostini começou a formação nas rampas só depois passando para as pistas. Campeão italiano de 175cc e 350cc, o ragazzo consegue um quarto lugar na estreia no Mundial e chama a atenção do conde Domenico Agusta. Este contrata-o para companheiro do consagrado Hailwood na todo-poderosa MV Agusta.
Logo no primeiro ano, o jovem italiano é vice-campeão das 500cc e só perde o título nas 350cc devido a um problema mecânico na última prova, em Suzuka. Quando no final dessa época Hailwood decide rumar à Honda (queixando-se da preferência do conde Agusta em relação a Giacomo), Agostini fica como primeiro piloto da MV Agusta e começa a sua extraordinária cavalgada: sete títulos nas 350cc e oito (sete consecutivos) nas 500cc. O último foi aos 33 anos, com a Yamaha, o primeiro título de uma moto a dois tempos na classe-rainha. Convertido mais tarde em Team Manager, foi nessa condição que contratou em 1982 um compatriota de nome Graziano Rossi...
TOP 10 LENDAS DO MOTOGP: 1º Valentino Rossi
O que faz de Valentino Rossi o melhor piloto de sempre do MotoGP? A rara combinação de um talento sobrenatural, um carisma incomparável... e as tecnologias da informação.
Ricardo S. Araújo
O ENVIADO DOS DEUSES
Naquele 16 de Setembro de 2007, a sala de imprensa do Autódromo do Estoril fervilhava de jornalistas vindos dos quatro cantos do mundo. Os olhares estavam fixos nos monitores que transmitiam a última volta do GP de Portugal de MotoGP - a vitória era discutida taco-a-taco pela Honda de Dani Pedrosa e pela Yamaha de Valentino Rossi. Quando o italiano saiu da Parabólica ligeiramente à frente de Pedrosa e cortou a meta com 0,175s de vantagem, um grupo de jornalistas espanhóis explodiu numa celebração ruidosa. Confuso, um congénere italiano perguntou o que comemoravam se o 'seu' piloto acabava de perder a corrida. A resposta foi desarmante: "Hombre, quando gana Valentino, ganamos todos. "
Rossi é um dos desportistas mais consensuais do século XXI, alguém que está para o motociclismo como Tiger Woods está para o golfe. O seu talento e personalidade hipnótica quase nos fazem esquecer os seus erros como aquela queda em Valência 2006 quando entregou o título a Hayden, ou as acusações de evasão fiscal em Itália que optou por não rebater, pagando antes 35 milhões de euros. Disso (quase) ninguém se lembra. Na memória estão as celebrações teatrais com a Tribo Dei Chihuahua, ou as mil-e-uma decorações da moto e capacete, e, claro, aquela fabulosa ultrapassagem a Jorge Lorenzo na última curva de Montmeló, um momento que condensou tudo o que as corridas devem ser: a luta de dois homens com armas iguais onde por fim é o talento que prevalece. E que talento...
Predestinado
Mas o que faz Rossi superar Giacomo Agostini e os seus incríveis 15 títulos mundiais? Na prática, trata-se de dois predestinados, dois sobredotados do motociclismo. A diferença é que 'Ago' teve a 'infelicidade' de dominar o Mundial numa época em que as MV Agusta oficiais não tinham oposição (o próprio nível geral dos pilotos era mais baixo desde o abandono de Hailwood e a morte de Saarinen), e numa altura em que a Internet e a TV por cabo eram conceitos de ficção científica.
Rossi, por outro lado, é o verdadeiro ícone global do motociclismo contemporâneo. A famosa batalha com Lorenzo na Catalunha foi vista em directo e a cores por dezenas de milhões em todo o mundo. E quem assistiu a momentos como a fabulosa corrida de Montmeló - as Leis da Física pareceram ficar em 'suspenso' quando o italiano mergulhou a M1 naquela última curva e depois segurou o natural 'ricochete' da gravidade; mas o que talvez poucos recordem é que, algumas voltas antes, Rossi já tinha redefinido os limites da pilotagem quando travou para a primeira curva, viu que Lorenzo tinha travado mais tarde... e voltou a recolher os joelhos para travar AINDA mais tarde! - daqui a 30 anos, esses milhões de felizardos não terão dúvidas em apontar o melhor de todos os tempos. Rossi nunca chegará aos 15 títulos de Agostini, mas ultrapassou o compatriota em (quase) tudo o resto.